segunda-feira, 22 de maio de 2006

Juramento

Ela apareceu na minha frente no dia mais improvável. Eu havia saído do escritório, sufocava de calor, reclamava. Mas tive de passar no gabinete do Prefeito para deixar uns malditos documentos. O que seria uma maldição, virou uma visão do céu.

A timidez que se esconde debaixo dessa pele grossa apareceu por inteiro. Fiquei vermelho, quase não falei, mas saí satisfeito. Queria ela pra mim de qualquer jeito.

Mandei carta, mandei flores, disse gracinhas e passei perfume. Ela se aproximou e me fez suar umas duzentas vezes. Mas a oportunidade nunca veio para nós. Coisa da vida.

Com o tempo, ela, que era um sonho de mulher, virou uma amiga dos sonhos. Confidente, conselheira. Poxa, quer coisa mais frustrante para um homem? Pois bem. Aliás, pois nada bem. Mas a gente se acostuma com quase tudo. E passei a vê-la assim.

Até ontem. Naquela festa banal, quase um aniversário de criança de tanta gente chata e tanta cerveja servida em copinho plástico, ela surgiu como um cometa. Camisa branca cheia de estilo, calça jeans colada no corpo, aquele cabelo, aquele sorriso. Tomei os últimos goles da pasta de cevada que esquentava em minhas mãos e fui encarar a fera.

Ela foi simpática e mágica, como sempre. E seguiu fiel o papel de amiga-que-é-amiga-não-beija-na-boca. Há situações que exigem um trabalho hercúleo, mas algumas vezes vale a pena carregar o peso do mundo nos ombros se for o caso.

Ofereci bebida para deixá-la solta. Risadas para deixá-la leve. Um toque inesperado para deixá-la surpresa. Uma poesia batida para me mostrar culto. Silêncio para deixá-la respirar. Por fim, ofereci minha boca para que ela provasse um novo gosto.

Ela me beijou furiosamente, apertou meu corpo. Depois, quando saiu para pegar um copo, me deixou cravado no lugar. Absolutamente estático. Na volta, me olhou nos olhos, segurou minhas mãos e pediu para que eu não deixasse jamais de ouvir seus segredos. Dei meu juramento, mesmo sabendo que não há jura que se cumpra. Foi apenas a primeira de minhas mentiras.

3 comentários:

Juliana Szabluk disse...

os melhores beijos são feitos de vento.
saudações.

Creco disse...

Bicho, tô impressionado.

Anônimo disse...

Lisonjeio...