Entro no cubículo e, antes de qualquer interrupção, pergunto:
_ Vai, me diz, o que será de mim quando tudo isso acabar?
_ O que é tudo, meu filho?
_ Tudo é o destino que escolhi para mim.
_ Só depende de você. Depende de seus atos.
_ Sim, eu sei. Mas você está sendo vago. Busca outra opção aí.
_ O futuro pode ter luz ou trevas. Será o que você quiser, meu filho.
_ Porra, tem de ficar com essas respostas vagas, sem pé nem cabeça? Quero algo do tipo: você vai encontrar a felicidade suprema ou ser atormentado pela eternidade. Porra.
_ Cuidado com as palavras aqui dentro, filho. Ele pode se zangar.
_ Taí. Isso é algo que eu gostaria de ver. Vai, nego, desce aqui. Ó pra você.
_ Para que tanta ira? Por que tanto rancor?
_ Porque não há respostas. Nunca há.
_ A resposta está em você. Busque-a com fé e encontrará seu caminho.
_ Foda-se!
Chutei a porra do confessionário e saí. Padreco do caralho. Ajudou tanto quanto uma cartomante ou um porre no boteco. Tá, depois de vários porres eu consegui algumas respostas, mas a questão agora é outra. Não quero recuperar uma mulher nem me queixar da sorte. Quero saber o que será de mim quando tudo isso acabar.
Atravesso a rua, páro no bar próximo pra tomar uma e fico atento ao movimento. Olho o relógio. Faltam dez minutos. A rua entre a igreja e a praça aqui ao lado está lotada. Um suor frio desce por meu pescoço. Sigo sem resposta. Caralho, para que raios fui entrar naquele lugar? "Busque-a com fé" a puta que o pariu.
Resolvo andar pela praça. Bonita, com algumas poucas árvores, uns banquinhos com anúncios de lojas que eu nunca havia reparado e os mendigos de sempre jogando conversa fora. Faltam cinco minutos. Isso aqui precisa mudar. E vai. Puta medo que não sai de mim. A sensação de ficar sem reposta é uma angústia inesperada.
Nunca achei que faria essa pergunta diante de toda minha convicção. O lance aqui é sofrimento. Todo mundo sabe. Mas o bem supremo está perto. Bem perto. Eu sei. Será mesmo? Maldito padre que questionou minha fé. Agora até eu hesito. Pára, respira.
Encosto em uma árvore e acendo um cigarro. É o último. Amasso e jogo o maço fora. A sensação é de alívio. Dou uma tragada forte e sopro. Tudo vira fumaça e cinza. Como as pessoas podem parecer tão calmas com o mundo inteiro pirando? Bando de alienados.
Vou até o carro e pego minha mala. Falta um minuto. Aperto o passo. Sigo até o centro da praça e tiro tudo cuidadosamente. Ninguém nota minha presença. Pronto, está tudo pronto. Meu relógio dispara o alarme. É hora.
O que será de mim quando tudo isso acabar? Penso e acendo o isqueiro. Ensopado pelos vinte litros de gasolina, a chama se espalha rapidamente. Não dói, não arde. Tudo fica amarelado e lento. Na porta da igreja, o padre surge atraído pelos gritos da multidão. Ele ficou me devendo uma resposta.
Um comentário:
Sobre luzes e sombras, o padre se vira e avisa que Belle Époque já acabou, saúda a pós-modernidade em um brinde com cachaça do buteco da esquina, que o garotinho que comparecia à igreja para satisfazer seus solitários desejos foi buscar.
Olhei pro padre, puta da cara, torta de bêbada e não entendi mais o que se passava. Dentre infinitas divagações como quem sou eu, pra onde irei e quem diabos levou minha casa (juro que estava aqui há cinco minutos atrás!) a resposta foi, portanto, encontrada:
não há resposta, pois não há pergunta afinal.
Respirei fundo, comprei meu eterno último maço de cigarros e caminhei para o puteiro mais próximo. Minha casa só apareceria com a chegada do sol.
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